Não, você não precisa ter o sobrenome do italiano.
Para o reconhecimento da cidadania italiana, é preciso que se comprove o vínculo parental entre as pessoas, isso quer dizer que, como a cidadania se dá pelo direito “ius sanguinis”, ou seja, literalmente, quer dizer que se passa a cidadania pelo sangue, portanto, no caso da cidadania italiana, que é baseada no princípio “ius sanguinis”, o descendente de italiano é italiano e por isso tem o direito de reconhecer a sua cidadania.
Dessa forma, em linhas gerais, como não existe limite de geração, as pessoas que descendem de italianos (salvo exceções, que não discutiremos aqui por não ser o objetivo deste post), sejam eles trinetos, bisnetos, tetranetos, podem reconhecer a cidadania italiana, desde que apresentem a documentação exigida.
Através dessa documentação, que são as certidões de registro civil, desde o italiano até o requerente, se prova que a pessoa que quer reconhecer a cidadania tem parentesco em linha reta com um italiano.
Exemplo:
Trisavô italiano > bisavô brasileiro > avô brasileiro > pai brasileiro > requerente da cidadania
Quando falamos em parentesco em linha reta, é esse caso do exemplo acima, ou seja, lá atrás, nos seus antepassados, existe um italiano e ele teve um filho, esse filho teve um filho, e assim por diante, até chegar em você.
Normalmente, nós recebemos nosso nome e o sobrenome de nossos pais e como muitas vezes o antepassado está lá longe e dependendo de como se constitui a sua linha reta e seu registro civil de nascimento, pode ser que você não tenha, ou não, o sobrenome do italiano.
Veja, ter o sobrenome do italiano não é impeditivo do reconhecimento da cidadania italiana, pois, como expliquei, o que fará prova é justamente a documentação que mostra que você é descendente em linha reta daquela pessoa.
Portanto, a dúvida está respondida, o requerente da cidadania italiana não precisa ter o sobrenome do italiano.
A questão que se coloca e que precisa ser esclarecida é quanto à retificação das informações e do sobrenome italiano nos casos em que se verifica a necessidade de tais correções.
Ocorre que, para o reconhecimento da cidadania italiana, apesar de o requerente não ter que ter o sobrenome italiano, é preciso que as certidões estejam todas com as informações corretas de todas as pessoas, isso quer dizer que se o sobrenome do italiano foi registrado de maneira incorreta, diferente daquela que consta na certidão de nascimento dele, é preciso que se corrija e se faça constar de maneira correta na documentação de toda linhagem parental que será usada no reconhecimento da cidadania italiana, além de outras informações que porventura possam estar erradas. Isso porque, dentro dos princípios do Direito, tanto brasileiro quanto italiano, e suas leis, é preciso que se comprove o laço “ius sanguinis” e para isso as informações das pessoas devem estar corretas em seus registros de nascimento, casamento e óbito (quando for o caso).
Por que essas informações devem estar todas corrigidas?
Porque para provar que você descende daquela pessoa, é preciso que se tenha certeza disso, que não se trata de homônimo, nem de fraude, enfim, deve estar bem claro tudo para quem vai fazer o reconhecimento da cidadania, seja o oficial do Comune, seja o juiz da causa.
Vamos supor que o italiano se chamasse Giovanni Ferrari e que a trisneta dele queira reconhecer a cidadania, sendo a linha de descendente a seguinte:
Giovanni Ferrari > Paulo Ferrer (brasileiro)> Daniel Ferrer > Gabriel Ferrer > Luisa Ferrer
Por algum motivo, o sobrenome do Giovanni, infelizmente, sofreu modificação aqui no Brasil. Seguindo o exemplo, vamos dizer que o Giovanni se casou e morreu no Brasil, sendo que seu nome constou como Giovano Ferrer no casamento e no óbito foi registrado como João Ferrar.
E apesar de ser um exemplo, esses erros são muito comuns. E para que se prove que o Giovanni Ferrari é a mesma pessoa que o Giovano Ferrer e o João Ferrar, é preciso corrigir toda a cadeia de documentos, incluindo de seus descendentes, porque, Ferrari, Ferrer e Ferrar não são iguais, portanto, não é o mesmo sobrenome, e isso causa insegurança jurídica, o que traz dúvida se as pessoas da linha são realmente descendentes do italiano Giovanni Ferrari. Portanto, para reconhecer a cidadania, terá que ser corrigido o sobrenome.
Mas aí nesse caso as pessoas vão ter que mudar o sobrenome e isso é muito complicado de mudar no RG, CNH, etc…
Não é tão complicado quanto parece atualizar os documentos pessoais, mas isso é tema para outro post.
Outro exemplo:
Antonio Caruccio (italiano) > Rafael Carioso (brasileiro) > Maria Carioso > Hugo Azevedo > Felipe Azevedo
Neste exemplo, vamos supor que Maria se casou com José Azevedo e que ao registrar o filho do casal, foi registrado com o sobrenome do pai apenas, por isso, seu nome é Hugo Azevedo e seu filho, que é trineto do Antonio Caruccio, não tem o sobrenome Caruccio.
O fato de Hugo e Felipe não terem o sobrenome Caruccio não impede o reconhecimento da cidadania italiana deles através do antepassado Antonio, porém, como no exemplo o sobrenome Caruccio aqui no Brasil passou a constar de maneira errada como Carioso, apesar de terem o direito garantido de reconhecimento da cidadania italiana, que não é impedido por não ter o sobrenome do italiano, é preciso corrigir o sobrenome Carioso do bisavô e da avó de Felipe, para que conste da maneira correta, ou seja, conforme o original italiano que deu origem ao Rafael e a Maria, que é corretamente grafado como Caruccio. Pois, como explicado no outro exemplo logo acima, Caruccio e Carioso não é o mesmo sobrenome e independentemente de Hugo e Felipe não terem esse sobrenome, é preciso que se corrija para que se comprove que são realmente descendentes do italiano Antonio Caruccio.
Por isso que é necessário que ao juntar toda a documentação para o reconhecimento da cidadania, se faça a análise da documentação por profissionais especializados, assim, se verificará o que é preciso corrigir para que você tenha sucesso no reconhecimento de sua cidadania italiana.
Veridiana Petri
OAB/SP 348.682
OA 64073P
Advogada Brasil e Portugal, ítalo-brasileira, Especialista em Relações Internacionais e Direito Notarial e Registral, pós-graduação em Direito Internacional e Direitos Humanos/2022, membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP – Núcleo de Direito dos Imigrantes e Refugiados.